Alguns valores só fazem criar problemas - problemas complexos de se resolver. Então, vamos avaliar brevemente alguns desses valores escrotos:
1. Prazer. Prazer é ótimo, mas é também um péssimo valor no qual basear sua vida. Pergunte a qualquer viciado em drogas aonde sua busca por prazer o levou. Pergunte ao adúltero que viu sua família se desintegrar e que afastou os filhos, se o prazer o deixou feliz. Pergunte a alguém que ficou à beira da morte por causa da gula excessiva se o prazer o ajudou a resolver seus problemas.
O prazer é um falso deus. Pesquisas mostram que concentrar energia em prazeres superficiais leva a ansiedade, instabilidade emocional e tristeza extrema. O prazer é o meio mais superficial de se obter satisfação; por consequência, essa satisfação é a mais fácil de obter, mas também a mais fácil de perder.
Apesar disso, o prazer é vendido vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana. É nele que nos fixamos. É a substância que usamos para nos entorpecer e nos distrair. Porém, embora necessário (em pequenas doses), o prazer não é suficiente. O prazer não é causa para a felicidade: é efeito dela. Se você acertar no restante (outros valores e parâmetros), o prazer virá naturalmente, como consequência.
2. Sucesso material. Muitas pessoas medem seu valor pessoal com base no dinheiro que ganham, no carro que dirigem ou num gramado mais verde que o do vizinho. Pesquisas indicam que, tendo nossas necessidades físicas básicas (comida, abrigo, etc.) supridas, a correlação entre felicidade e sucesso material a partir desse ponto se aproxima rapidamente do zero. Isto é: se você passa fome e mora na sarjeta, dez mil dólares a mais por ano teria um grande impacto no seu nível de felicidade; para a classe média de um país bem estruturado, dez mil dólares a mais por ano quase não teria impacto na sua vida - o que significa que você está se matando de trabalhar por basicamente nada.
O outro problema da supervalorização do sucesso material é o perigo de priorizá-lo acima de outros valores, como honestidade, civilidade e compaixão. Quando as pessoas avaliam a si mesmas não por seu comportamento, mas pelos símbolos de status atrelados a elas, estão sendo não só superficiais como idiotas também.
3. Estar sempre certo. Nosso cérebro é uma máquina falha. Estamos sempre fazendo suposições incorretas, avaliando mal as probabilidades, rememorando eventos de forma imperfeita, cedendo a predisposições cognitivas e obedecendo aos nossos caprichos emocionais. Sendo humanos, é muito comum nos enganarmos, por isso se a sua medida de sucesso é estar certo, você vai encontrar dificuldade em racionalizar todas essas merdas que
alimenta na sua cabeça.
O fato é: quem quer estar certo em tudo para valorizar a si mesmo não consegue aprender com os próprios erros. Pessoas que se baseiam nesse parâmetro não têm a capacidade de aceitar novas perspectivas e ter empatia. Elas se fecham para informações novas e importantes. É muito mais útil se presumir ignorante e limitado. Isso vai libertá-lo de crenças supersticiosas ou equivocadas e colocá-lo num estado constante de
aprendizagem e crescimento.
4. Otimismo implacável. Há quem avalie a vida segundo a capacidade de ser otimista em relação a quase tudo. Perdeu o emprego? Ótimo! Uma oportunidade de explorar novas paixões. Seu marido traiu você com sua irmã? Bem, pelo menos você descobriu o que realmente significa para aqueles que a cercam. Seu filho está morrendo de câncer no esôfago? Bem, ao menos você não vai precisar pagar a universidade! Ainda que exista valor em “ver o lado bom das coisas”, a verdade é que às vezes a vida é uma droga mesmo, e a atitude mais saudável é admitir isso.
Negar sentimentos negativos só os aprofunda e prolonga, levando a problemas emocionais sérios. Positividade constante é uma forma de fuga, não uma solução válida para os problemas da vida — sobretudo porque esses problemas podem revigorá-lo e motivá-lo se os valores e medidas corretos forem aplicados.
É simples: coisas dão errado, pessoas cometem erros, acidentes acontecem. Tudo isso deixa a gente na merda. E tudo bem. Sentir-se mal é um componente imprescindível da saúde emocional. Negar sentimentos ruins é perpetuar problemas em vez de solucioná-los.
Quando se trata de emoções negativas, o truque é: 1) expressá-las de um jeito socialmente aceitável e saudável e 2) expressá-las de uma forma que esteja alinhada aos seus valores. Exemplo simples: um dos meus valores é a não violência. Então, quando fico com raiva de alguém, posso expressar esse sentimento, mas sempre tomando o cuidado de não dar um soco na cara de quem me irritou. É uma ideia radical, eu sei.
Mas a raiva não é o problema. A raiva é natural. Faz parte da vida. A raiva é, sem dúvida, saudável em muitas situações. (Não esqueça que as emoções são apenas um mecanismo de
resposta.)
O problema seria socar as pessoas. A raiva é apenas o mensageiro do meu punho na sua cara. Não culpe o mensageiro. Culpe meu punho (ou sua cara). Quando nos forçamos a ser otimistas o tempo todo, negamos a existência dos problemas. E quando negamos nossos problemas, nos privamos da chance de resolvê-los e de criar felicidade. Os problemas geram uma sensação de propósito e dão substância à vida. Por isso, evitá-los é o mesmo que levar
uma existência sem sentido (mesmo que supostamente agradável).
A longo prazo, terminar uma maratona nos deixa mais felizes do que comer um bolo de chocolate. Criar um filho nos deixa mais felizes do que ganhar uma partida de videogame. Abrir uma pequena empresa com amigos e vencer dificuldades financeiras nos deixa mais felizes do que comprar um computador novo. São atividades estressantes, árduas e muitas vezes desagradáveis, além de trazer consigo inúmeros problemas, mas, ao mesmo tempo, são as que nos proporcionam os momentos mais marcantes e constituem nossas maiores
alegrias.
Atividades como essas envolvem dor, cansaço, raiva e até desespero - mas, depois de concluídas, olhamos para trás emocionados. É o que contaremos aos nossos netos. É como Freud disse: “Um dia, quando olhar para trás, os anos de luta lhe parecerão os mais bonitos.”
Isso explica por que não devemos pautar nossa existência em valores escrotos - prazer, sucesso material, estar sempre certo e otimismo implacável. Alguns dos melhores momentos da vida não são prazerosos, não são grandiosos, não são reconhecidos e não são positivos.
O importante é ter bons valores e bons parâmetros, e o prazer e o sucesso virão como consequências naturais. Se tomados como valores em si, trazem apenas euforias vazias.
Mark Manson